‘Fóssil do dia’: Brasil leva ‘prêmio’ na COP26 por ‘tratamento horrível e inaceitável’ aos povos indígenas

Foto: Reprodução

Ativistas ambientais na COP26, a conferência climática da ONU, escolheram o Brasil como o “Fóssil do Dia” nas negociações de sexta-feira (5) em Glasgow, na Escócia, por “seu tratamento horrível e inaceitável aos povos indígenas”.

O prêmio é concedido de forma irônica, uma vez por dia, durante as conferências climáticas da ONU, desde 1999. Membros da Rede de Ação do Clima (CAN, na sigla em inglês) votam em países considerados como tendo feito o “melhor” para bloquear o progresso nas negociações nos últimos dias de negociações. (Veja lista dos ‘premiados’ nesta COP mais abaixo nesta reportagem).

A escolha de sexta-feira foi feita depois que o presidente Jair Bolsonaro criticou a ativista indígena brasileira Txai Suruí por seu discurso na conferência, na segunda (1º). Ela relatou aos líderes mundiais sobre o impacto que as mudanças climáticas já estão tendo em seu povo.

Txai Suruí, indígena de Rondônia, foi a única brasileira a discursar na abertura da COP26 — Foto: Gabriel Uchida/Arquivo pessoal
Txai Suruí, indígena de Rondônia, foi a única brasileira a discursar na abertura da COP26 — Foto: Gabriel Uchida/Arquivo pessoal

O presidente não citou a mulher indígena nominalmente, mas afirmou a apoiadores que “levaram uma índia [sic] para lá, para substituir o Raoni, para atacar o Brasil”.

Em comunicado à imprensa, os ativistas da CAN comentam a escolha e dizem que, “infelizmente”, a fala de Txai Suruí “não caiu muito bem em casa, onde ela foi publicamente criticada pelo presidente brasileiro Jair Bolsanaro, por ‘atacar o Brasil’, levando os trolls online a abusar da jovem de 24 anos”.

Eles afirmam, ainda, que ela foi “supostamente submetida a bullying de um funcionário do Ministério do Meio Ambiente do governo brasileiro, que se ergueu sobre ela dizendo que ela ‘não deveria bater no Brasil'”.

Os ativistas continuam dizendo que “esse comportamento desprezível está bem documentado no Brasil”, onde “invasões de terras indígenas dispararam”, “a mineração de ouro selvagem está poluindo os cursos d’água” e “a intimidação é abundante e eles têm um vice-presidente que justificou negar água doce às aldeias atingidas por Covid porque ‘os índios bebem dos rios'”.

‘Esperar que a sanidade seja restaurada’

A CAN também criticou o fato de o presidente brasileiro não ter ido a Glasgow – “preferindo visitar sua casa ancestral na Itália e sair com um líder de extrema direita” –, mas acrescentou, de forma irônica, que a ausência de Bolsonaro “foi na verde uma coisa boa, pois permitiu que os diplomatas do país viessem prontos para se comprometer e até mesmo assinar acordos sobre metano e florestas”.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Na terça-feira (2), o Brasil foi um dos cerca de 100 países que se comprometeram a reduzir as emissões de metano em até 30% até 2030. O país também prometeu acabar com o desmatamento ilegal até 2028 – ignorando, entretanto, os recordes de desmatamento registrados desde o ano passado.

Os ativistas concluem a parte sobre o Brasil dizendo que “tudo o que podemos esperar é que a sanidade seja totalmente restaurada após as eleições, programadas para ocorrer em outubro próximo, e políticas progressistas sejam implementadas para salvaguardar a terra e os direitos dos povos indígenas e proteger o que sobrou das florestas tropicais”.

‘Hexafóssil’

Essa é a sexta vez que o Brasil leva o “prêmio” de Fóssil do Dia nas negociações da COP desde 2017. Naquela ano, durante a gestão de Michel Temer, o país ganhou o destaque negativo por causa de uma medida provisória que propôs reduzir impostos da exploração e produção de petróleo e gás.

Em 2018, foi “premiado” por declarações do então presidente eleito Jair Bolsonaro e de Ernesto Araújo, que seria nomeado como ministro das Relações Exteriores.

Em 2019, o país levou o “troféu” 3 vezes: por “culpar a sociedade civil pelas queimadas na Amazônia”, “legitimar a grilagem de terras e a anistia do desmatamento” e, por fim, o prêmio de “Fóssil Colossal”, por culpar ambientalistas pelas queimadas na Amazônia.

Segundo lugar: Austrália

Em segundo lugar na “premiação” de sexta (5) ficou a Austrália, “vencedora” pela terceira vez apenas nesta edição da COP.

“Hoje temos o prazer de anunciar mais uma novidade para a Austrália. Eles são o primeiro país a conquistar um hat-trick de prêmio fóssil e ainda falta uma semana [para o fim da conferência]. E este gongo prestigioso é apresentado para marcar seu desempenho verdadeiramente inacreditável no Dia da Energia”, disseram os ativistas, de forma irônica.

Eles continuam: “enquanto 190 países estavam superando o carvão, 100 obedientemente tinham suas canetas prontas para assinar a promessa global de metano e 20 países concordaram em parar de financiar projetos internacionais de combustíveis fósseis, o que nossos camaradas antípodas estavam fazendo?”

“Bem, às vezes as coisas ruins vêm em três, aparentemente”, dizem os ativistas.

“O primeiro exportador de gás do mundo e o segundo exportador de carvão [em referência à Austrália] estava se preparando para o número três, com planos de se tornar um grande exportador de petróleo. Essas abelhas ocupadas decidiram solicitar consultoria sobre dez novas áreas para exploração de petróleo offshore, exaltando os benefícios econômicos que isso traria”, afirmaram.

“O que esses drongos [forma de insulto no inglês australiano] não conseguem entender é que não há economia em um planeta morto. Faça a coisa certa; se inscreva, prometa e anuncie planos – para um futuro renovável”, pediram, por fim.

A Austrália já havia levado o segundo lugar do “prêmio” na segunda-feira (1º) – atrás do Reino Unido – e o terceiro na terça (2), atrás de Noruega e Japão.

Na quarta (3), os “campeões” foram Estados Unidos, França e a Associação Internacional de Comércio de Emissões (Ieta, na sigla em inglês). A Polônia foi a “campeã” da quinta-feira (4).

Por g1