COP 30, o Desenvolvimento da Amazônia e o Ponto B – por João Arroyo

Foto: Ricardo Stuckert/PR

Por João Claudio Tupinambá Arroyo

Belém do Pará começa a fervilhar em função da realização da COP 30, daqui a dois anos, em 2025. Em uma semana recebemos o Presidente Lula, logo depois, em um mesmo dia, na retomada do PPA, o orçamento participativo federal, tivemos cinco ministros, seus secretários e outros assessores, cada um com pautas específicas, logo depois mais dois ministros visitaram Belém, todos trazendo investimentos.

Nunca antes neste país, nesta cidade, vimos tantas autoridades trazendo tantas oportunidades, animando sonhos e espertezas. Uns, focados em fazer história coletiva, outros, focados em fazer fortuna individual…e há ainda os/as que acreditam ser possível combinar as duas coisas, ao arrepio da história.

A conquista da realização da COP 30 em Belém, mérito indiscutível do governador Helder, que tomou a iniciativa, e da sensibilidade do presidente Lula, que fez acontecer, demonstra que a Amazônia, possui uma centralidade mundial, que não é de hoje, que pode ser trabalhada para a construção de uma nova história. Só precisa fazer os próprios amazônidas compreenderem sua própria força, se articulados, e lugar no mundo.

O “novo” está, basicamente, em fazer com que a magnifica fortuna que já temos, gere riquezas primeiro aqui mesmo, como todas as nações “desenvolvidas” fizeram. Uma oportunidade que só se realizará se superarmos a alma de colonizados que ainda é majoritária em nossos tomadores de decisão, públicos e privados.
Ou seja, por dentro do desafio de fazer com que nossos recursos gerem riqueza aqui, temos o desafio cultural de materializar valor à nossa própria identidade e ao nosso próprio território e recursos nele contido, o primeiro passo para exercermos o Protagonismo Amazônida que, se não exercermos, a história não nos perdoará, nem nossos filhos, netos e bisnetos.

O primeiro passo, muito importante, é compreendermos que este processo, não trata de Crise Climática como eles colocaram no título para disfarçar o papel deles nesta história. O que está em jogo é o Modelo de Desenvolvimento, baseado na ideia do crescimento infinito, que exauriu muitos recursos naturais, provocando o desequilíbrio climático. E, na ideia da “soma zero”, que significa entender que para ganhar, é preciso que alguém perca. Devastação e desigualdade é a lógica que levou o mundo a uma concentração de riquezas onde o 1% mais “rico”, concentra a mesma riqueza dos 99% mais empobrecidos. No Brasil é um pouco pior. E o incrível, é que aqui tem muita gente que acha que tem os mesmos interesses do 1%…seguem assim a reproduzir a alma dos colonizados.

Se a questão é o Modelo de Desenvolvimento, precisamos entender do que se trata. Muito laconicamente, diria que “desenvolver” é sair da condição social A, que é a síntese da soma combinada das condições econômicas, políticas, ambientais, tecnológicas, cognitivas, epistemológicas(de conhecimento), e culturais em que se vive coletivamente em Sociedade, para a condição social B. A questão é que condição social B é esta? Significa a melhoria da qualidade de vida de todos e todas? Significa uma melhora no sentido da acumulação material, do conforto tecnológico e/ou do conforto social, civilizatório/existencial? Onde, afinal, colocamos o ponto B?

Por exemplo. Já conversamos aqui nesta coluna sobre o significado do PIB(Produto Interno Bruto) que, como o nome diz, mede produção, ou seja, a capacidade de trabalho de uma nação em seu próprio território. Neste ranking estamos entre os maiores do mundo, 12° hoje. Já o IDH(Índice Desenvolvimento Humano da ONU), que é uma “média” das condições combinadas de educação, saúde e renda per capita de uma nação, mede parcialmente o conforto social. Neste ranking do IDH somos a 87ª nação entre 191 outras. Veja, a nação que tem a 12ª maior produção de riquezas do mundo possui a 87ª qualidade de vida no planeta. Será que tem algo errado? Ou deve ser assim mesmo?

Mas é preciso ir um pouco mais fundo. Por que o diagnóstico de que isto está errado é um consenso mundial, entre as maiores autoridades do mundo, desde a Conferência da ONU, Rio92, mas nada muda?
Uma das respostas que ganha muita força é a Economia Comportamental, que também já tratamos nesta coluna. É a aplicação da psicologia na economia. Ora, diz a teoria, se toda ordem econômica se sustenta no comportamento do consumidor, por isso o marketing, o centro do Modelo Econômico está nos valores, crenças e conhecimentos que se tornam cultura na Sociedade, rotinas, hábitos, tradições. Cultura entendida como tudo o que cultuamos e cultivamos. Cultuamos com nossa subjetividade e cultivamos com nosso trabalho.

Traduzindo a conclusão que podemos sintetizar de psicólogos que ganharam o Nobel de Economia, Kahneman(2002) e Thaler(2017), é que temos uma Sociedade doente. Tivemos um processo de desenvolvimento que apesar das grandes conquistas tecnológicas, mantemos 2/3 da humanidade na pobreza, batendo o recorde dos 1%, mais ricos, concentrarem individualmente 50% de toda a riqueza produzida pela humanidade, coletivamente. Sendo que 90% por herança.
Poderosos adoecidos que adoecem a Sociedade reproduzindo sua insegurança moral, baixa autoestima, amargura, frustrações, traumas e usura que motiva a todos lutarem contra todos e buscarem concentrar coisas, mesmo que a qualidade de vida, a segurança, ar puro e outras coisas que só se tem coletivamente, sejam pioradas. Sim, é possível evoluir para pior. Como dizem os médicos e médicas “o paciente evoluiu a óbito”.

Logo, para termos capacidade de refletir sobre que ponto B queremos, precisamos deixar de ser pacientes e passarmos a ser protagonistas. Mas só o conhecimento ajuda a iniciar este processo. Veja, pra começar, precisamos entender que nossa história não começa em 1.500 quando Cabral chegou aqui. Nós, seres humanos, estamos há 12 mil anos neste território, hoje chamado Amazônia.

Os europeus chegaram a apenas 523 anos, dos 12 mil que estamos aqui. Quando chegaram viviam 5 milhões de pessoas só na calha do Rio Amazonas. De diversas nações, que os europeus por ignorância, pensavam que estavam nas Índias, chamaram de índios. Mas na verdade eram Tupinambás, Yanomamis, Tembés, Kayapós etc, etc. Civilizações com outras soluções para os problemas sociais(econômicos, políticos, tecnológicos, epistemológicos).

Nações que partilhavam o território, na maior parte do tempo em paz, diferente dos europeus que cultivam a guerra e a dominação desde os Gregos e Romanos, que aos outros chamava de bárbaros e, com esta justificativa, os barbarizava, os escravizava e assim se apoderava da riqueza alheia.
Nações que se integravam ao território sem devastá-los, praticando o desenvolvimento sustentável e a bioeconomia bem antes dos europeus descobrirem esta possibilidade após destruírem seus ambientes onde vivem e exportar este modo de vida.

Nações que além de desenvolverem tecnologias de sinergia com o equilíbrio climático, ao mesmo tempo resolveram outro grande problema que ameaça a humanidade, a miséria extrema, as desigualdades e a baixa governança política. Nações sem desigualdade, sem criança abandonada, sem idosos esquecidos, sem misérias.

Nações que prosperavam, mesmo sem a tecnologia de engenharia, de química e de energia, inclusive a nuclear, que os europeus desenvolveram. Ou seja, não se trata de uns contra os outros. Se trata do aprendizado histórico de que podemos articular as melhores soluções de uns e outros. A história, ciência das ciências, nada nem ninguém pode apagar, embora tentem desesperadamente.

É este ponto B que está em pauta nesta COP 30, queremos mais acumulação de bens ou mais felicidade humana? Como uma coisa se articula com a outra, e em que medida? Queremos soluções melhores para uns ou para todos e todas? Queremos opulência ou paz?

Sim, é você que decide, quando compra, quando vota, quando escolhe. Ah, a omissão também é uma escolha, a de não atrapalhar o que é mais forte.
@joao_arroyo