Coluna Visão Econômica #3: Os Tabus que precisamos enfrentar para que possamos nos Desenvolver como nação

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Por João Claudio Tupinambá Arroyo

Lembro de uma entrevista do navegador Amyr Klink ao Jô Soares em que revelou que quando foi planejar a passagem pelo Cabo das Tormentas, ao Sul da África, todos os comentários é que seria impossível com um veleiro tão pequeno quanto o dele, porque haviam ondas gigantes. Todos os navegadores que ele conhecia diziam a mesma coisa. Mas, por algum motivo, ele resolveu consultar os registros da autoridade náutica e climatológica da África do Sul, e qual a sua surpresa, as tais ondas gigantes não existiam. Amyr Klink bateu um novo recorde.

Quantas suposições, como as das ondas gigantes, que ganham até a opinião pública, não nos impedem de tomar decisões corretas? Na economia, por sua proximidade com a política e interesses particulares, estes Tabus são muito frequentes.

Apenas a Ciência pode aplacar esta tormenta, por buscar entender a realidade como ela é, friamente. Não para revelar “a” verdade, mas para elaborar a melhor solução possível, conforme o conhecimento construído, que pode melhorar a solução sucessivamente, sempre que o conhecimento seja acumulado.

Mas vamos aos Tabus que precisamos superar. Na coluna anterior abordamos o PIB, e já tratamos de um Tabu: o PIB não mede desenvolvimento econômico, mas crescimento da produção, veja lá. Hoje, vamos tratar dos três tabus que mais amarram nosso desenvolvimento…

O primeiro grande Tabu da economia, que precisa ser destroçado, é sobre o “Motor da Economia”. O motor da economia não é a produção, é o consumo. Sem consumo não há produção, sem demanda não há oferta. Todo empreendedor sabe, que na prática, ninguém oferta nada que não visualize primeiro para quem irá vender. E, só se vende para quem, além de uma necessidade ou desejo específico que o faça querer o produto, tenha renda suficiente para adquiri-lo. Se o consumidor quer, mas não pode, não adianta nada. Então, é por isso que para desenvolver a economia a locomotiva é o consumo. Ela puxa a produção que puxa o emprego, o trabalho e novas oportunidades de empreender, que puxam a renda que puxa o consumo e assim temos um ciclo econômico virtuoso, que ainda pode ser incrementado com crédito, investimento tecnológico, infraestrutura etc.

Esta é a lógica básica da Economia de Mercado, mecanismo econômico, aliás, muito anterior ao Capitalismo, que carrega toda a sabedoria humana para uma Sociedade equilibrada, se há alguém fora do mercado então a Sociedade não está bem. O problema surge quando se estabelece a desigualdade no fluxo da renda. Por exemplo, caso brasileiro, quando escolho priorizar a exportação, o que importa não é a renda que circula no país, mas no país estrangeiro. Há setores da nossa economia que não dependem da renda do consumidor brasileiro, inclusive gostam quando os salários são reprimidos, porque só representam custos. Mas para os empresários que vendem para o mercado interno, o salário não é só custo, é renda, é consumo, é faturamento e lucro. Embora muitos destes, irracionalmente, apoiem a repressão aos salários e outros mecanismos de aquecimento da renda, como a previdência e, portanto, do consumo interno. Daí que a economia não é mesmo uma ciência exata, é uma ciência humana que às vezes, só a psicologia e a psiquiatria explicam.

O segundo Tabu que precisa ser quebrado é o do fator gerador da riqueza. Pense em alguém que possua a maior acumulação de ativos disponíveis no planeta, exceto o trabalho. Pense em alguém que detenha montanhas de matérias primas, dinheiro, informações estratégicas, mas que não possa dispor, direta ou indiretamente, de um único ser humano para trabalhar, nem braçal nem intelectualmente. Como poderá fazer sua “riqueza” crescer mais? Adam Smith, em sua obra prima, A Riqueza das Nações, diz que a riqueza é a capacidade de mobilizar trabalho para a solução de problemas. Daí, dois questionamentos que precisamos enfrentar: Se o ser humano é o único capaz de trabalho e trabalho é o único fator de geração de valor e riqueza, por que há miséria? Uma nação que possui, por exemplo, 15 milhões de desempregados mais 11 milhões de desalentados que nem mais procuram emprego perfazendo 26 milhões improdutivos, está desperdiçando um volume considerável do único ativo capaz de acumular mais ativos, ou seja, gerar riqueza, logo, este deveria ser o objetivo econômico mais importante para a Sociedade exigir da gestão pública. Não?

O terceiro Tabu que propomos destruir, por hoje, é de que a base da economia está na Agricultura e na Indústria, portanto, são mais importantes que o Comércio e os Serviços. Não é assim. Primeiro que tudo, há aí um problema metodológico, Economia é um “Sistema” e como sistema deve ser estudada e entendida. Todas as suas dimensões estão interligadas e são interdependentes. Só por isso este Tabu já merece ser destruído. Mas o pior é que, mesmo considerando a condição de interdependência entre os setores econômicos, a importância social e produtiva dos Serviços é cada vez maior. Hoje, mais de 70% dos postos de trabalho estão no setor Serviços, assim como são os Serviços que dão a maior contribuição para composição produtiva do PIB brasileiro. Esta não é uma realidade apenas brasileira, é uma realidade mundial porque a tendência à Sociedade do Conhecimento é irrefreável. A crescente sofisticação intelectual do consumidor médio exige cada vez mais serviço embutido nos produtos e já surgem cadeias inteiras que se estabelecem sem produto físico, apenas com o fluxo de informações, como na educação, consultorias, medicina etc.

Ora, quanto mais tecnologia, menos postos de trabalho são gerados pela indústria e agricultura, e é bom que seja assim, porque liberta seres humanos de trabalhos muito pesados, podendo ainda gerar menor impacto ambiental, mas estes postos de trabalho precisam de recolocação e é o setor Serviço que pode cumprir este papel, mas exige prioridade e qualificação. Na verdade, o discurso de qual setor é mais importante, é político e visa mais investimento público – apesar de quase sempre criticarem o papel do Estado na Economia(que refletiremos em outra oportunidade). Assim, outra irracionalidade que identificamos é a ausência dos empreendedores de Serviços, que não bancário, no grande debate econômico nacional, tanto mais que quase totalmente dependentes da economia interna. Ou seja, Serviço é Tech, Serviço é Pop, Serviço é (quase) Tudo…mas precisa ser defendido.

Claro que há outros Tabus e cada um tem a sua lista de importância, mas nossa humilde contribuição é no sentido de ajudar a criar uma inteligência econômica amazônida, paraense, que olhe e se relacione com o mundo, mas pela primeira vez, adotando o lugar em que vivemos, e as pessoas com quem convivemos, como nossas principais referências. O mundo vive o tempo da Economia do Conhecimento, da Educação e da Sustentabilidade, mas qual a melhor tradução para nossa realidade social e ambiental? Este é o desafio desta coluna. Até nosso próximo encontro.

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