Coluna Visão Econômica #2: O que o PIB realmente significa?

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João Claudio Tupinambá Arroyo

O grande dramaturgo brasileiro, Nelson Rodrigues, desenvolveu dentre seus talentos, depois de décadas de jornalismo inteligente, o de cunhar frases célebres de grande impacto social e político. Inclusive no campo da economia. Uma vez, o autor de A Vida como Ela É… disse, “no Capitalismo tudo se compra, até amor sincero”, que repercute até hoje traspassando todo o espectro ideológico. Mas a máxima cunhada por Rodrigues que inspira hoje, esta coluna, é “Toda unanimidade é burra”.

Este é o caso do PIB para a quase totalidade dos analistas econômicos que se expressam na grande mídia, e acabam vitimando importantes setores sociais, empresariais e até acadêmicos…

O PIB – Produto Interno Bruto, é um indicador econômico calculado cientificamente pelos técnicos do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, importantíssima organização pública do Estado brasileiro. Mas o que realmente significa?

Antes de entrar no mérito da questão, chamo atenção para dois pontos que são pressupostos para nossa análise. Enfatizo que os cálculos são feitos por técnicos, ou seja, por seres humanos, porque para alguns, estes números surgem como que por encanto e daí agem, como se não coubesse nenhuma ponderação ou questionamento possível. Os cálculos devem seguir padrões científicos aplicados com transparência e estar submetidos à pluralidade crítica da academia para que além de objetividade tenha legitimidade científica.

Da mesma forma, enfatizamos que a defesa da autonomia política do IBGE – enquanto ferramenta estatal, pública, ou seja, da Sociedade – é fundamental para que a demonstração estatística da realidade nacional não seja influenciada por interesses particulares e passageiros de governos e não prejudique o planejamento de sujeitos públicos e privados que fazem acontecer o desenvolvimento da nação.

Considerando estes dois pressupostos, adotamos a definição de PIB do próprio IBGE “O PIB é a soma de todos os bens e serviços, por seus preços finais, produzidos pela nação em um país, estado ou cidade, geralmente em um ano” (https://youtu.be/lVjPv33T0hk). Entendeu? Diz respeito à produção, à quantidade, à capacidade produtiva da nação, à tecnologia, ao investimento de capital em produção. Não diz respeito à consumo, à qualidade, à qualidade de vida, à investimento em organização, infraestrutura e conforto social.

Precisamos então compreender a diferença entre Crescimento e Desenvolvimento Econômico. Tomando as reflexões consolidadas no âmbito da ONU a partir de 1972, se tornou consenso científico que o PIB mede Crescimento e Crescer é ficar maior, já Desenvolver, é outra coisa, é ficar melhor. Nesta época, o Brasil foi chamado de Belíndia, porque tinha a elevada produção da Bélgica, mas o baixo padrão de vida médio da Índia.

Na época, o Brasil despontava com o 8º maior PIB do planeta, mas assustava com uma colossal concentração de renda que se tornava visível pelo baixíssimo padrão de vida da grande maioria da Sociedade brasileira. Ou seja, nem sempre o foco no PIB conduz a nação a uma melhor qualidade de vida ou desenvolvimento econômico.
Passados quase 50 anos desta constatação científica e política, o problema econômico estrutural do Brasil permanece.

Como nação, combinamos, com total irracionalidade, uma capacidade brutal de gerar um fluxo de produção gigante, com uma baixíssima capacidade de acumular riqueza social.

Em outras palavras, vivemos a contradição de ao mesmo tempo em que a nação, com seu trabalho e empreendedorismo, consegue alcançar uma das maiores produções do mundo, não consegue aquecer sua economia interna, base de qualquer economia do “primeiro mundo”, como um fator de desenvolvimento, equilíbrio e sustentabilidade social, punindo trabalhadores e empreendedores que dependem da economia interna, comprar e vender no mercado interno, justamente a realidade de mais de 90% dos brasileiros. Por que?

Manter as análises, a opinião pública e as políticas econômicas orientadas apenas pelo PIB como indicador de desenvolvimento, como vemos, é uma das distorções centrais para não desenvolvermos a inteligência social necessária para elaborarmos consensos políticos capazes de viabilizar estratégias realmente eficazes para nos conferir o desenvolvimento que precisamos, e que, já temos força econômica suficiente para alcançar.

A irracionalidade econômica que vivemos hoje, e marca nossa história, é um dos tabus que precisamos enfrentar e que vamos tratar na próxima edição desta coluna. Até lá!

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Ranking mundial pelo PIB, as 20 maiores economias. 2020 OCDE
Gráfico do Banco Mundial registrando a evolução do PIB brasileiro, em dólar, desde 1960. Pode ser acessado por qualquer pessoa. Está a disposição no Google, é só buscar por “PIB Brasil”. Veja e reflita, você mesmo, os períodos de maior crescimento, o salto que demos nos anos 2000, que nos levou ao 6º maior PIB do planeta e reflita sobre as oportunidades concretas que temos para nos desenvolver.