A Conta que pagamos – Por João Arroyo

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Recentemente, o atual governo federal, divulgou oficialmente o que foi executado do Orçamento da União em 2021.
Já valeria escrever sobre a confissão de ter gasto proporcionalmente menos em Ciência e Tecnologia, que todos os seus antecessores, inclusive os militares, golpeando de morte a produção de conhecimento base para a inovação, inclusive a produtiva, obrigando que paguemos cada vez mais royalties para criações de fora. Aumentando custos, inflacionando preços, reduzindo consumo e ainda há empresários, que vendem para o mercado interno, apoiando tudo isso.

Ou, já seria importante destacar que apenas 20%, do já pífio orçamento do Ibama para fiscalização e proteção de nossos ativos econômicos naturais, foram gastos. O que significa franquear ao caos o acesso de nossos ativos naturais, exatamente o que nos diferencia em todo o planeta, favorecendo grupos específicos que não conseguiram ainda perceber que podem ganhar muito mais com a floresta em pé e as águas puras e cristalinas, remunerando a ignorância de um setor empresarial potente mas atrasado social e tecnologicamente, subserviente à Divisão internacional do trabalho, ditada pelos conglomerados transnacionais sem respeitar a cultura e potencialidades dos povos.

As privatizações, então, são um escândalo. Estatais lucrativas sendo abatidas a preço vil para o enriquecimento de grupos específicos que vão massacrar seus concorrentes, que por mais incrível ainda, os apoiam. Segmentos inteiros de investidores hipnotizados como que pelo flautista de Hamelin.  Conto folclórico, reescrito pelos irmãos Grimm retratando infestação ocorrida na vila alemã, em 1284.

Mas aqui vamos ao que nos parece ser o ponto estratégico central. A Dívida Pública. Não ela em si, o que também merece atenção, já que o principal dela deve ter causa legítima. O ponto que destacaremos é como a Dívida Pública tem sido usada para justificar a maior imposição a uma nação para pagar a conta que não é sua, que se tem notícia no mundo.

Na publicação oficial do atual governo federal, 1,96 trilhões de reais foram repassados aos credores da Dívida Pública Brasileira, na quase totalidade bancos e outras instituições financeiras privadas internacionais. Quase 2 trilhões, mais da metade(50,78%) do Orçamento Público de 2021. Veja, mesmo agora, quebrado, o Brasil ainda possui o 15º maior PIB do planeta. Ou seja, estamos tratando de cifras estratosféricas em qualquer moeda, seja dólar, euro ou libra esterlina.

Reflita, quando os EUA entraram na Grande Crise de 1929, assim que a Europa recuperou sua indústria, após a I Guerra Mundial que a destruiu, e deixou de importar dos americanos, a saída foi a Dívida Pública. Liderados pelo estrategista econômico britânico Keynes, o Estado americano bancou com recursos públicos, frentes de trabalho para os milhares de desempregados e linhas de crédito sem juros para os empresários pelo menos manterem seus investimentos em condições de retomada. Com as frentes de trabalho, injetou uma massa salarial que imediatamente se converteu em consumo estimulando a volta da produção e com isso a contratação de trabalhadores, agora pela própria iniciativa privada, fazendo a roda da economia girar de novo.

Mas tudo isso com a emissão de moeda sem lastro. Ou seja, com endividamento público, mas a favor da nação. Até hoje, os EUA possuem a maior Dívida Pública do mundo, 15 trilhões de dólares, quase o dobro do segundo colocado, a Inglaterra, seguido da França, a terceira colocada, em termos absolutos. No ranking mundial de endividamento publico em proporção ao PIB, o primeiro lugar é do Japão. Epa, peraí, EUA, Inglaterra, França, Japão, então quer dizer que parte importante do primeiro mundo tem no endividamento público uma das estratégias de seu desenvolvimento? Sim.

No Brasil, boa parte engoliu a estória, tão boba quanto falsa, que a administração de um país é igual a de uma casa, não pode gastar mais do que ganha. Ora, até em uma família, é possível emprestar dinheiro, ou seja, se endividar, para abrir um negócio e passar a aumentar o ganho, né? Logo, a questão não é realizar o endividamento, mas como este é investido. Sendo que no caso de um país, o grau de liberdade e fatores de retorno são muito maiores.

Logo, o problema não é o endividamento público em si. Mas o que, e quem ganha, com a ideia de que não se pode aumentá-lo sob nenhuma hipótese.

Neste ponto é preciso registrar que há 20 anos surgiu no Brasil o Movimento pela Auditoria da Dívida, logo depois da crise de 2008, quando técnicos brasileiros participaram da auditoria das dívidas do Equador e da Grécia, feitas pelo FMI. Depois das respectivas auditorias, as Dívidas Públicas dos dois países foram reduzidas em até 70%, porque na auditoria comprovaram que havia dívida ilegítima, dívida que tinha sido paga e dívida inventada para favorecer graciosamente apoiadores do governante de plantão. Será que alguma coisa assim pode ter ocorrido no Brasil? Estamos nos referindo a desde 1808, quando a família real veio para o Brasil e nos tornou Reino Unido, passando a fazer a contabilidade da nação.

Uma outra peça, neste quebra-cabeça, que nos ajuda a entender o cenário é a tal Lei do Teto de Gastos. Quando Michel Temer toma posse, logo após o ilegítimo impeachment de Dilma Roussef, duas ações claramente lideradas de fora, foram engendradas a toque de caixa, ou de mala?… A aprovação da Lei do Teto de Gastos e a Lei da quebra do monopólio da Petrobras sobre as reservas do Pré Sal.

Na aprovação da quebra do monopólio brasileiro sobre o Pré Sal, deputados estranharam e depois confirmaram que quem estava assessorando a mesa da Câmara Federal era um consultor da petroleira americana SHELL, podiam ser mais discretos. Na aprovação da Lei do Teto de Gastos, proibiram acréscimo de gasto em todos os itens do orçamento, menos no item Dívida Pública, este que nos levou 2 trilhões de reais em 2021, em que os credores também são de fora.

Há países que negociaram percentagens de seu PIB para o pagamento da Dívida(juros e serviços) aos credores. Assim, só aumenta o pagamento se a produção crescer. Pelo menos assim se garante um padrão que não prejudica o patamar de investimento interno. No caso brasileiro, com obediente açodamento aprovaram uma Lei sem nenhuma negociação de contra-parte em benefício do interesse nacional.

Nos termos em que estamos operando, mesmo em uma crise como a Pandemia, que prejudicou tanto o crescimento econômico quanto o desenvolvimento, somos obrigados a resguardar o pagamento da Dívida, mesmo sacrificando investimentos em saúde, educação, infraestrutura para a população que tanto se fazem necessários.

Quando saímos do Brasil, a maioria de nós, rende homenagens ao desenvolvimento alheio justamente pela qualidade da infraestrutura, dos serviços prestados, dos produtos acessados, sem refletir quem foram investimentos justamente em educação, ciência e tecnologia, em infraestrutura, segurança e conforto social que proporcionaram a acolhida com tanta qualidade.

Agora imagine se estabelecermos que vamos auditar a Dívida Pública e estabelecer uma percentagem teto do PIB para o pagamento de juros, serviços e amortizações. Reduzindo nosso desembolso em 1 trilhão, dos 2 que nos pesam anualmente. Imagine 1 trilhão a mais em Infraestrutura, Educação, Saúde, Segurança, Moradia, Crédito produtivo etc.

O primeiro mundo fica bem aqui…logo acima do pescoço. Vem timbora!!!

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