Foto: Reprodução/WhatsApp/DOL
Por Alexandra Cavalcanti, DOL
Milhares de pessoas saíram pelas ruas de Belém, na manhã deste domingo (01), durante a II Marcha de Belém Contra o Trabalho Infantil. O evento foi organizado pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 8ª Região, que busca chamar a atenção para essa situação e reafirmar o prejuízo causado a crianças e adolescentes que trabalham.
Dados mais recentes mostram que quase 2,5 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos estão trabalhando no Brasil, de acordo com um levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e apresentado em 2016. No Pará são 168 mil meninos e meninas submetidas a essa condição.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) define como trabalho infantil aquele que priva as crianças de sua infância, de seu potencial e de sua dignidade. É também a forma de trabalho prejudicial ao desenvolvimento físico e mental delas e que as priva de oportunidades de frequentar a escola. Ou seja, por trás daquela criança e adolescente que está vendendo balas no sinal, lavando vidros de carros, vendendo sacolas em feiras, entre outras situações, há uma série de prejuízos, que devem ser visualizados e entendidos por todos.
“Uma pesquisa recente mostra que 97% dos encarcerados hoje no Brasil foram crianças e adolescentes que trabalharam”, ressalta a desembargadora Maria Zuíla Dutra, uma das gestoras da Comissão de Combate ao Trabalho Infantil e uma das coordenadoras da II Marcha de Belém Contra o Trabalho Infantil. Para ela, um dos principais prejuízos relacionados a questão do trabalho infantil está na educação.
“Ele acaba resultando na evasão escolar que para nós é uma questão primordial. Além disso, existem muitos outros prejuízos como a própria violência e a exploração sexual, além de muitos outros. Para se ter uma ideia, em condições de trabalho semelhante, as crianças se acidentam em média três vezes mais que os adultos”, informa.
A desembargadora afirma ainda que a luta contra o trabalho infantil é sempre árdua e precisa muitas vezes ser iniciada dentro dos lares.
“Ele acaba sendo naturalizado dentro da família, que não é capaz de enxergar o prejuízo que aquele trabalho pode causar para aquela criança e adolescente, em muitas situações por também ser vítima de uma condição de pobreza que acaba levando ao trabalho infantil”, analisa.
Ela destaca que quase sempre ser submetido a esse tipo de trabalho deixa marcas para o resto da vida. “Falo isso porque sei exatamente como é. Eu vivi a situação de trabalho infantil e até hoje carrego marcas disso em mim”, contou a desembargadora, que quando criança precisou vender lanche em fábricas e apanhar pedras em pedreiras, localizadas no município de Santarém, onde passou a infância com a família.
COMBATE
A juíza do Trabalho Vanilza Malcher, que também é gestora da Comissão de Combate ao Trabalho Infantil e coordenadora a II Marcha de Belém Contra o Trabalho Infantil, reforça que é urgente que a naturalização do trabalho infantil seja combatida.
“Essa história de que é melhor a criança e o adolescente trabalhar do que roubar precisa acabar. Até porque dados confirmam que apenas 3% deles conseguem um lugar ao sol depois de ser submetido a essa condição. E mesmo para aqueles pais que trabalharam enquanto criança e acreditam que aquilo foi bom para eles, dificilmente colocam seus próprios filhos para trabalhar. Muito pelo contrário”, destaca.
Ela ressalta que o TRT 8 trabalha efetivamente nessa questão desde 2015, quando ocorreu a I Marcha de Belém Contra o Trabalho Infantil, para alertar a todos sobre o quão prejudicial é o trabalho infantil.
“Essa é uma causa que precisa envolver a todos. Normalmente as pessoas acreditam sempre que é uma questão apenas dos governos, por meio da criação e do desenvolvimento de políticas públicas, mas não só. Essa é uma questão que envolve as famílias, os órgãos, os empresários que podem abrir as portas de suas empresas para que os jovens possam trabalhar na condição de aprendizes com seus direitos preservados, inclusive a escola e a sociedade como um todo, que precisa participar, principalmente denunciando”, afirma.
No caso do TRT 8, segundo ela, existe um trabalho que vem cada vez mais se consolidando nesse sentido e que já apresenta frutos importantes como o Programa Padrinho Cidadão, lançado em 2016 pelo órgão.
“Por meio dele contamos hoje com cerca de 70 padrinhos voluntários que dão assistência a crianças e adolescentes de vários bairros de Belém, ajudando a mantê-los longe do trabalho infantil”, explica.
Expectativa é de reunir cerca de 100 mil pessoas
A I Marcha de Belém Contra o Trabalho Infantil ocorreu no dia 1º de março de 2015, por sugestão da desembargadora Maria Zuíla Dutra para a Comissão Nacional de Combate ao Trabalho Infantil, a qual ela integra.
“A minha ideia era promover uma ação em todos os tribunais do Brasil para chamar a atenção das pessoas para essa causa, foi daí que surgiu a Marcha”, lembra.
Na ocasião, 30 mil pessoas saíram pelas ruas de Belém contra o trabalho infantil. “Dessa vez, a nossa previsão é a de que pelo menos 100 mil pessoas participem da ação, porque esse é um problema grave, que precisa ser combatido”, diz.
UNIÃO
Para Vanilza, o trabalho desenvolvido ao longo desses cinco anos entre a I Marcha e o evento deste domingo mostra que juntos é possível trabalhar em prol de uma causa.
“Ao longo desses anos conseguimos a união de várias instituições, parcerias e o apoio da própria sociedade. Conseguimos inclusive fazer ressurgir um Fórum (o Fórum Paraense de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalho Adolescente) que tem hoje uma atuação fundamental”, avalia.
Durante o percurso da Marcha, serão feitas leituras que vão mostrar a realidade do trabalho infantil no Pará e no Brasil todo.
“Enquanto houver trabalho infantil, marcharemos pelas ruas de Belém para mostrar que somos contra essa condição de trabalho a que são submetidas tantas crianças e adolescentes no nosso país e no mundo inteiro”, finaliza.