Por Catarina Barbosa – Amazônia Real
Belém (PA) – Em fevereiro deste ano, o governo do presidente Michel Temer (PMDB) publicou no Diário Oficial da União uma medida provisória e dois decretos presidenciais determinando providências de caráter emergencial para atender os venezuelanos que entram no Brasil pela fronteira de Roraima, região onde a crise humanitária é mais acentuada. Antes, no entanto, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) recomendou à Presidência da República e à Casa Civil da Presidência da República a instalação urgente de um Gabinete Emergencial de Gestão Migratória composto pelo governo federal e governos estaduais e municipais envolvidos na acolhida das venezuelanas e dos venezuelanos no Brasil.
Na recomendação, o CNDH também pediu que o governo federal realizasse o estudo e a implementação de um plano de interiorização que possa apoiar venezuelanas e venezuelanos que cheguem via Roraima e desejem buscar outros destinos no Brasil, além da elaboração e adoção de protocolos nacionais de atendimento diferenciado à população indígena migrante, com ampla consulta nos termos da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Sem apoio de governos ou organizações, os indígenas Warao estão se deslocando para o Brasil desde 2014 vindos da região caribenha do Delta do Rio Orinoco, área que abrange todo o estado de Delta Amacuro e zonas dos estados de Monagas e Sucre.
A Polícia Federal diz que 17.130 venezuelanos solicitaram refúgio no ano de 2017 na cidade de Pacaraima, na fronteira de Roraima com Venezuela. Na estatística não há o número de quantos são mulheres, homens e crianças e nem quantos são indígenas entre os refugiados.
Por causa da inviabilidade dos Warao na crise humanitária, a agência Amazônia Real vem acompanhando desde 2016 a situação dos indígenas venezuelanos nas cidades de Pacaraima e Boa Vista, em Roraima, em Manaus, no Amazonas, e recentemente em Belém e Santarém, no Pará, em diversas reportagens.
Em janeiro, quando a primeira reportagem da série “Migrante cidadão” foi publicada, haviam nessas cinco cidades do Norte do Brasil 915 indígenas venezuelanos. Um novo levantamento realizado nesta quarta-feira (14) mostra que eles são 783 pessoas. Houve uma pequena redução de migrantes, que estão constantemente em deslocamentos. Em Boa Vista e Pacaraima eles são 382 pessoas, mas no grupo há índios Warao, Panare e Pemon. Estão vivendo em abrigos de Manaus 140 Warao. Já em Belém eles são 112 pessoas e, em Santarém 149 indígenas da mesma etnia.
Em Belém, capital do Pará, o Mercado do Ver-o-Peso é conhecido como a maior feira ao ar livre da América Latina. Entre as milhares de pessoas que circulam todos os dias no lugar, entre feirantes, clientes, turistas, desde o início do mês de outubro 2017 chama atenção um grupo de mulheres Warao.
Atualmente 57 índios estão alojados em pensões do bairro do comércio, em ruas próximas do Mercado Ver-o-Peso. Outros 55 estão abrigos do governo do Estado. As pensões, assim como a alimentação, são custeadas por meio da doação arrecadada pelas indígenas na companhia de seus filhos. Algumas delas vão acompanhadas pelos maridos, mas normalmente as mulheres Warao tomam à frente no ato de pedir. Elas fazem isso com a certeza de que essa é a única forma de conseguir comida, roupas e também arrecadar recursos para enviar para os parentes que residem na Venezuela.
A jornada dos Warao em Belém foi marcada por resistência, muito diálogo e finalmente um entendimento agora que foram para o abrigo. O primeiro contato à reportagem da Amazônia Real não foi muito bem recebido por eles. Impacientes com as muitas promessas feitas e não cumpridas pelos órgãos públicos de assistência humanitária, a indígena Melina Perez dizia “Não vai resolver”, quando tentávamos ouvi-la para saber como estava sendo a presença deles na cidade. A resistência passou e ela permitiu-se falar e começou a narrar sua jornada.
Com pouco mais de um metro e meio de altura, longos cabelos negros e dentição precária, Melania conta que chegou a Belém de barco em um grupo de cinco pessoas, sendo dois deles crianças. De Santarém até Belém o percurso é de 925 quilômetros por via fluvial pelo rio Amazonas. “Só os adultos pagaram passagem”, diz ela para em seguida explicar sua presença em Belém. “Em Manaus não tem mais dinheiro. Não tem mais como arrecadar”, afirma.
O termo “arrecadar” corresponde ao fato de que os indígenas pararam de receber doações. Melania e os outros quatro indígenas dormem hoje no abrigo Domingos Zahluth, localizado na Rua Cametá, no bairro do Comércio, em Belém, mas por mais de 30 dias, o grupo de Melania dormia em redes atadas entres os boxes da feira. Durante o dia, ela e outros indígenas circulavam na praça ou ficavam sentados no chão ou em cima de caixas de papelão.
Nesse alojamento improvisado, a índia dividia espaço com moradores de rua, restos de comidas e a sujeira. Transpassado ao corpo, Melania carregava uma espécie de sling – chamados por eles de ”doanacá” –, usado para levar junto a si uma criança que no momento não estava com ela.
Melania Perez fala firme e gesticula muito ao saber que não poderia mais ir para a sua na companhia do filho e que se porventura fizesse isso, ele seria retirado dela. “Mas as crianças não trabalham, elas não andam”, questiona Melania agitando os braços.
O restante da matéria pode ser lida em www.amazoniareal.com.br
Em Santarém
Os Warao chegaram em 28 de setembro do ano passado em Santarém, cidade banhada pelo rio Tapajós, no oeste do Pará. No primeiro grupo tinham 27 mulheres, 14 homens e 58 crianças e adolescentes de um total de 99 pessoas. No dia 14 de janeiro deste ano nasceu mais uma criança na cidade. Com o aumento no número de migrantes, a Prefeitura Municipal decretou situação de emergência social devido à falta de recursos para o atendimento humanitário e de saúde aos indígenas.
Com articulação da Prefeitura e sociedade civil, os indígenas passaram quatro dias em um alojamento da Igreja Batista, e em seguida um mês no alojamento da Diocese de Santarém até serem levados para o Abrigo Municipal de Adultos e famílias, onde estão até o momento. Agora estão na cidade 149 índios Warao.
Geisa de Oliveira, assessora de comunicação da Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social (Semtras), explica que as únicas exigências dos indígenas foi referente a alimentação. “Eles disseram que não comiam carne, somente frango. Também não bebiam sopa e nos pediram trigo com fermento”, afirma.
O cientista social Pedro Roberto Meinberg também reforça que no município não houve resistência ao abrigo. “Sempre demos todo o apoio aos Warao e até onde eu sei nenhum deles chegou a dormir na rua”, finaliza.
O restante da matéria pode ser lida em www.amazoniareal.com.br